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O benefício do uso de anti-inflamatórios em serviços de pronto atendimento

Publicado em 3 de outubro de 2023

Dra. Deborah Six – CRM/SP 182.090
Médica especialista em Anestesiologista formada pelo Centro de Ensino e Treinamento (CET) do Hospital da Beneficência Portuguesa de São Paulo. Master of Business Administration (MBA) em Gestão em Saúde. Especialista em Clínica Médica.

 

A dor é uma das principais causas do sofrimento humano e sua existência afeta a qualidade de vida de quem a sente, repercutindo negativamente em questões sociais e econômicas, com comprometimento da qualidade de vida.1 A presença de dor aguda configura-se como um dos principais motivos da busca pelos serviços de urgência e emergência no Brasil, podendo corresponder a 60% dos atendimentos nessas unidades de saúde e ser considerado um problema de saúde pública.2 Além de dores osteomusculares – que correspondem a cerca de 23% dos atendimentos – outras inúmeras condições estão associadas à presença de dor aguda e à necessidade de tratamento imediato, sendo as principais causas médicas relacionadas à dor aguda na emergência as relacionadas a processos inflamatórios, traumas, lombalgia, cervicalgia miofascial, dor abdominal, cefaleia, dor torácica e dor secundária a infecções respiratórias altas.3,4

Considerando o tratamento adequado da dor em pronto atendimento, estão disponíveis diversas medicações para o tratamento da dor aguda, que vão desde analgésicos e anti-inflamatórios não esteroidais (AINEs) até opioides, antagonistas dos receptores de NMDA e outros.4

Figura 1. Escada analgésica da OMS.
Adaptada de: Ventafridda V,
et al., 1985.5

 

Os AINEs constituem uma das classes de fármacos mais difundidas em todo o mundo, utilizados no tratamento da dor aguda e crônica decorrente de processo inflamatório, sendo considerados como primeiro passo na escala de tratamento de dor preconizada pela Organização Mundial da Saúde (OMS). AINEs como Teflan® (tenoxicam) e Artrinid® (cetoprofeno) podem ser utilizados não só como medicações para alívio da dor e controle de inflamações, mas também para controle da dismenorreia.6

Os AINEs apresentam como vantagem, além do eficiente poder analgésico, o baixo custo, a ação antipirética e o fato de não causarem depressão respiratória, não promoverem tolerância e, principalmente, no contexto mundial atual do abuso de opioides, não produzirem dependência química.6,7

Seu principal mecanismo de ação é a inibição da síntese de prostaglandinas. Os AINEs, ao inibirem a síntese de prostaglandinas e tromboxano mediante a inativação das enzimas ciclo-oxigenases constitutiva (COX-1) e induzível (COX-2), são úteis no manejo de manifestações sintomáticas musculoesqueléticas nos pacientes com lombalgia.6

Além disso, contam com diversas formas de apresentação disponíveis, como comprimidos, apresentações intravenosas e intramusculares, para uso tópico, pomadas e uso retal. Destaca-se a apresentação tópica do Cetrolac® (trometamol cetorolaco), AINE tópico em forma de colírio, por exemplo, que permite o tratamento tópico para dores agudas causadas por cirurgias oculares ou por infecções locais, como conjuntivites.

Também é válido ressaltar que o efeito analgésico dos AINEs é observado tanto na utilização isolada quanto na associação com outros fármacos. Ainda, para o controle da dor aguda, o efeito sinérgico entre AINEs e opioides como o Codex® (fosfato de codeína + paracetamol), Dolo Moff® (sulfato de morfina) ou anestésicos locais como a Lidojet® (lidocaína) apresenta bom controle álgico e, apesar dos efeitos colaterais, os AINEs apresentam perfil aceitável de segurança.5,6,8

O uso de AINEs em serviços de pronto atendimento permite um controle de dor aguda eficaz, com alta precoce e mínimos efeitos colaterais, conforme propostas atuais de protocolos de qualidade institucionais e de eficácia de controle de dor, promovendo analgesia de melhor qualidade, com menores efeitos adversos que uso de opioides intravenosos isolados. E, graças ao sinergismo, quando associados a outros medicamentos, os AINEs diminuem custos e favorecem uma maior satisfação dos pacientes.

Estudos mostram que o uso de AINES como o cetorolaco tem eficácia analgésica semelhante em doses intravenosas diferentes, mostrando que o cetorolaco intravenoso administrado na dose máxima analgésica proporcionou alívio eficaz da dor em pacientes em pronto atendimento com dor moderada a intensa, sem aumento dos efeitos adversos.9 Além disso, trabalhos evidenciam que mesmo o uso de uma dose única de AINEs em serviços de emergência é capaz de reduzir scores de dor dos pacientes, sem diferença significativa entre quais deles serão utilizados.10 

Como qualquer medicação disponível, a prescrição deve respeitar as contraindicações existentes, levando em consideração as possíveis interações medicamentosas e a correta prescrição em populações especiais, como idosos. O uso de AINEs na população pediátrica também deve seguir os mesmos princípios.11

Portanto, a escolha adequada de um AINE no tratamento dependerá das características de cada paciente, suas preferências, fatores de riscos/benefícios e efetividade terapêutica desejada, podendo haver possibilidades de diferenciadas respostas. Ainda, deve ser baseada em sua toxicidade, custo favorável, experiência de emprego e conveniência de administração para o paciente. Quando prescrito para uso domiciliar, é necessário também que o AINE apresente na receita médica as informações corretas e legíveis sobre o uso, e o paciente deve ser orientado corretamente sobre os efeitos.5-7,11,12

Apesar de todos os dados disponíveis, a literatura mostra que até 20% dos pacientes de pronto atendimento continuam com dor após o atendimento inicial. Sabe-se que o estresse oxidativo e alterações endócrino-metabólicas ao estresse causados pela dor aguda intensa ou maltratadas podem precipitar eventos cardiovasculares, com aumento da frequência cardíaca e pressão sanguínea e vasoconstrição, podendo desencadear eventos indesejáveis, como arritmias e isquemias.13

Assim, além dos benefícios descritos, os anti-inflamatórios são seguros e têm perfil de efeitos colaterais relativamente baixo, quando utilizados corretamente.14 Sempre lembrando que esses medicamentos não devem ser usados de forma indiscriminada ou sem supervisão médica. 

Diante disso, concluímos que o uso de anti-inflamatórios em serviços de pronto atendimento permite um controle de dor aguda de forma eficaz, com alta precoce e mínimos efeitos colaterais, conforme propostas atuais dos protocolos institucionais e de qualidade de controle de dor hospitalar, promovendo uma analgesia de melhor qualidade, menores efeitos adversos que uso de opioides intravenosos, com sinergismo quando associados a outros medicamentos e maior satisfação do paciente.

 

Referências:Referências

  1. Bottega FH, Fontana RT. A dor como quinto sinal vital: utilização da escala de avaliação por enfermeiros de um hospital geral. Texto Contexto Enferm. 2010;19(2):283-90.
  2. Rodrigues ISA, Oliveira LMM de, Fernandes FECV, Teles MEV. Prevalence of acute pain in patients attending the emergency room. Rev. Dor 2017;18(4):327-31.
  3. Ximenes AKR, Costa TNM, de Araújo AVS, dos Santos VNM, Alves MS. Perfil clínico de idosos atendidos em uma unidade de pronto atendimento em um hospital de Belém. Revista Eletrônica Acervo Saúde 2020;12(10):e3965.
  4. Amarante LCDS. Caracterização da demanda dos serviços de saúde em unidades de pronto atendimento segundo critérios classificação de risco, características sociodemográficas e super utilização. Piracicaba, 2014. 82 f. (Tese Curso de Odontologia), Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP).
  5. Ventafridda V, Saita L, Ripamonti C, De Conno F. WHO guidelines for the use of analgesics in cancer pain. Int J Tissue React. 1985;7(1):93-6.
  6. Wannmacher W, Passos LFS. Anti-inflamatórios não esteroides. In: Fuchs FD, Wannmacher L, editores. Farmacologia clínica: fundamentos da terapêutica racional. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2010. p. 408-21.
  7. Figueiredo WLM, Alves TCA. Uso dos anti-inflamatórios não esteroides no controle da dor aguda: revisão sistemática. Revista Neurociências 2015;23(3):463-7.
  1. Nimmo SM, Foo ITH, Paterson HM. Enhanced recovery after surgery: Pain management. J Surg Oncol. 2017;116(5):583-91.
  1. Motov S, Yasavolian M, Likourezos A, Pushkar I, Hossain R, Drapkin J, et al. Comparison of Intravenous Ketorolac at Three Single-Dose Regimens for Treating Acute Pain in the Emergency Department: A Randomized Controlled Trial. Ann Emerg Med. 2017;70(2):177-84.
  2. Wright JM, Price SD, Watson WA. NSAID use and efficacy in the emergency department: single doses of oral ibuprofen versus intramuscular ketorolac. Ann Pharmacother. 1994;28(3):309-12.
  3. Ribeiro H, Rodrigues I, Napoleão L, Lira L, Marques D, Veríssimo M, et al. Non-steroidal anti-inflammatory drugs (NSAIDs), pain and aging: Adjusting prescription to patient features. Biomed Pharmacother. 2022;150:112958.
  4. Bindu S, Mazumder S, Bandyopadhyay U. Non-steroidal anti-inflammatory drugs (NSAIDs) and organ damage: A current perspective. Biochem Pharmacol. 2020;180:114147.
  5. Tanno AP, Marcondes FK. Estresse, ciclo reprodutivo e sensibilidade cardíaca às catecolaminas. Rev. Bras. Cienc. Farm. 2002;38(3):273-89.
  6. Bidese BL, Sakuma KA, de Andrade Júnior A, Sartor MC. Postoperative anal-gesia by non-specialists in pain. Rev Dor 2014;15(1):36-40.

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