Publicado em 14 de abril de 2021
Anteriormente conhecidas como Infecções Hospitalares, as Infecções Relacionadas à Assistência à Saúde (IRAS) são infecções adquiridas durante a prestação dos cuidados em ambientes que prestam assistência à saúde e se configuram como os eventos adversos mais frequentes. A cada 100 pacientes hospitalizados, 7 em países desenvolvidos e 10 em países em desenvolvimento irão adquirir pelo menos uma IRAS.1
Além de afetarem centenas de milhões de pessoas em todo o mundo, as IRAS levam a altas taxas de morbidade e mortalidade, o que afeta diretamente a segurança do paciente e, por sua vez, a qualidade dos serviços de saúde (Figura 1).2
Figura 1: IRAS: um problema de qualidade nos serviços de saúde.
A vigilância das IRAS é complexa e requer o uso de critérios padronizados, disponibilidade, para o infectologista, de ferramentas de diagnóstico e capacitação técnica para interpretar os resultados. As IRAS podem levar a hospitalização prolongada, aumento da resistência de microorganismos a antimicrobianos, custos adicionais maciços para os sistemas de saúde, altos custos para os pacientes e suas famílias, além de mortes desnecessárias. Para diminuir os índices de infecção, a constante reavaliação das práticas assistenciais prestadas pelos médicos aos pacientes, assim como a implantação de um programa de redução de infecção, são essenciais para aprimoramento da assistência à saúde.3
Nos hospitais brasileiros, as IRAS, em particular ocasionadas por microrganismos multirresistentes (aqueles que apresentam resistência a pelo menos duas classes de antimicrobianos), são uma séria preocupação. Isso se deve ao fato de que alternativas de tratamento tornam-se reduzidas por prolongar internações, ocasionar óbitos e elevar os custos assistenciais. Visto que ambientes hospitalares contaminados contribuem para a transmissão desses micro-organismos através do manuseio de superfícies contaminadas por pacientes ou profissionais da saúde, o risco de infecções por patógenos multirresistentes vem aumentando consideravelmente.4,5
A Organização Mundial de Saúde (OMS) reconhece os episódios de IRAS como um problema de saúde pública e recomenda que as autoridades em âmbito nacional e regional desenvolvam ações para reduzir o risco de contrair essas infecções. No Brasil, existe um consenso claro dos especialistas na área sobre a necessidade de tomada de ações estratégicas para a redução das IRAS. Nesse sentido, observa-se um importante engajamento entre as agências de saúde pública federal (Agência Nacional de Vigilância Sanitária, Anvisa), estaduais CECIH(Coordenação Estadual de Controle de Infecção Hospitalar) e locais CMCIH (Coordenação Municipal de Controle de Infecção Hospitalar) – e CCIH (Comissão de Controle de Infecção Hospitalar) e os profissionais de saúde das instituições. Esse envolvimento é vital para a implantação, sustentabilidade e expansão de um programa de vigilância e prevenção de IRAS. A Anvisa, juntamente à liderança dos infectologistas, vem produzindo, desde 2008, manuais que abordam diferentes questões relacionadas às principais síndromes infecciosas relacionadas à assistência à saúde, incluindo suas definições, indicadores, medidas e estratégias de prevenção.3
Atualmente, a partir de recentes estratégias bem-sucedidas, alguns autores propõem que a eliminação de IRAS irá depender de quatro pilares estratégicos de ações: 1) promover a adesão a práticas baseadas em evidência, educando, implementando e realizando investimentos; 2) aumentar a sustentabilidade por meio de alinhamento de incentivos financeiros e reinvestimento em estratégias que demonstrarem sucesso; 3) preencher as lacunas de conhecimento para responder a ameaças emergentes por meio de pesquisas básicas, epidemiológicas e translacionais; 4) coletar dados para direcionar esforços de prevenção e mensurar os progressos (Anvisa, 2013).3
Em um primeiro momento, o sistema nacional de notificação dos indicadores de infecções relacionadas à assistência à saúde teve como prioridade a vigilância do indicador de infecção primária de corrente sanguínea. Progressivamente, outros indicadores são objetivo de ação, a saber: consolidação do sistema nacional de vigilância epidemiológica das IRAS, redução nacional de incidência das IRAS prioritárias, prevenção e controle da disseminação da resistência microbiana em serviços de saúde, consolidação do Programa Nacional de Prevenção e Controle de Infecções Relacionadas à Assistência à Saúde.6
As taxas de IRAS são maiores para pacientes internados em unidade de terapia intensiva do que aqueles internados em enfermarias. Nesse contexto, intervenções educativas, lideradas pela infectologia e especialidades envolvidas, com implementação de protocolos nas instituições de saúde favorece a padronização da manutenção, em especial com dispositivos invasivos, podendo reduzir a colonização e posterior casos de infecção.7
Medidas para prevenção de IRAS devem ser adotadas em todos os estabelecimentos de assistência à saúde, desde o âmbito hospitalar, passando por estabelecimentos de cuidados de pacientes crônicos até a assistência domiciliar. De acordo com a literatura, quando os estabelecimentos de assistência à saúde e suas equipes conhecem a magnitude do problema das infecções e passam a aderir aos programas para prevenção e controle de IRAS, pode ocorrer redução de até 70% para algumas das IRAS, como por exemplo, para as infecções da corrente sanguínea.8
O pronto cumprimento às práticas básicas de controle e de prevenção de infecções é um fator fundamental para que os índices de IRAS possam ser minimizados. O médico infectologista e toda a equipe multidisciplinar devem estar atentos à implantação de precauções padrão e de isolamento, além de procedimentos corretos de esterilização e desinfecção, com medidas específicas para segurança das medicações intravenosas. Limpeza ambiental, água e saneamento em ambientes de saúde também são alguns exemplos de ações promotoras da saúde.
Para alcançar altos índices de sucesso no combate às IRAS é importante destacar a relevância do fortalecimento das instâncias regulatórias, principalmente com o apoio dos gestores centrais para garantia de recursos humanos e materiais com todo o respaldo para a execução das ações. Ressalta-se ainda que a participação das CECIHs, CMCIHs e CCIHs na execução das ações previstas nesses programas é essencial.3,8
Referências:
1. WHO, World Health Organization. Patient Safety. A World Alliance For Safer Health Care. Health care-associated infections Fact Sheet. 2014. Disponível em: https://www.who.int/gpsc/country_work/gpsc_ccisc_fact_sheet_en.pdf/. Acesso em 29/01/2021.
2. ANVISA. Segurança do Paciente. PNPCIRAS 2016-2020. Disponível em: https://www20.anvisa.gov.br/segurancadopaciente/index.php/publicacoes/item/pnpciras-2016-2020. Acesso em: 29/01/2021.
3. ANVISA. Segurança do Paciente. Manuais/Livros/Guias/Diretrizes. Indicador Nacional de Infecção Relacionada à Assistência à Saúde. Disponível em: https://www20.anvisa.gov.br/segurancadopaciente/index.php/publicacoes/item/indicador-nacional-de-infeccao-relacionada-a-assistencia-a-saude. Acesso em: 29/01/2021.
4. Luciano Freitas Fernandes, Geziella Áurea Aparecida Damasceno Souza, Anna Christina de Almeida. Identification and characterization of methicillin-resistant Staphylococcus spp. isolated from surfaces near patients in an intensive care unit of a hospital in southeastern Brazil. Revista da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical. 2020 Nov 6; 53: e20200244.
5. Oliveira AC, Damasceno QS, Ribeiro SMC. Healthcare-associated infection: challenges in its prevention and control [Portuguese]. Revista Mineira de Enfermagem. [Versão Online]. 2009; 13(3): 445–50. Disponível em: http://www.reme.org.br/artigo/detalhes/211./ Acesso em: 29/01/2021.
6. Sociedade Paulista de Infectologia. Epidemias das infecções relacionadas com a assistência à saúde (IRAS) no Brasil. Disponível em: https://infectologiapaulista.org.br/. Acesso em: 29/01/2021.
7. Anna Letícia Miranda, Ana Lúcia Lyrio de Oliveira, Daiana Terra Nacer, Cynthia Adalgisa Mesojedovas Aguiar. Results after implementation of a protocol on the incidence of urinary tract infection in an intensive care unit. Comparative Study. Rev Lat Am Enfermagem. 2016 Sep 9; 24(0): e2804.
8. CDC, Centers for Disease Control and prevention. Current HAI Progress Report. Healthcare-associated Infections (HAI) Progress Report. 2019. Disponível em: https://www.cdc.gov/hai/data/portal/progress-report.html./ Acesso em: 29/01/2021.
9. https://www.saude.rj.gov.br/comum/code/MostrarArquivo.php?C=Njk3Mg%2C%2C – Acesso em 11/02/2021.
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